O Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário (NAT-Jus) é um órgão que desempenha papel crucial na análise de pedidos relacionados a procedimentos médicos, insumos e fornecimento de medicamentos no contexto judicial. É acionado quando um paciente recorre ao Poder Judiciário após receber receita ou indicação médica e não conseguir realizar o tratamento. Nele, o farmacêutico e outros profissionais da saúde atuam para consolidar informações e garantir a uniformidade e a precisão das análises técnicas que vão auxiliar os magistrados na tomada de decisões para análise dos itens solicitados.
No NAT-Jus, o farmacêutico é consultado, a pedido do juiz, para emissão de parecer técnico que consideram as políticas públicas de saúde, normativas sanitárias e regulatórias, abordando questões como a indicação de uso do medicamento, alternativas terapêuticas fornecidas no SUS, riscos e benefícios, bem como quanto à avaliação de eficácia, segurança e custo dos tratamentos, considerando as evidências científicas disponíveis.
A unidade do NAT-Jus do Rio de Janeiro foi a primeira a ser constituída no Brasil e está em operação desde 2009. É a maior em estrutura e, só este ano, já recebeu mais de 3500 processos, com previsão de atender 7 mil demandas até o final de 2024.
O farmacêutico Flávio Badaró coordena a equipe com aproximadamente 60 profissionais, sendo 15 farmacêuticos, uma vez que medicamento é o item mais demandado. "Já tivemos 90 profissionais e, agora, estamos em tratativas para a reposição desse quadro para que possamos continuar atendendo às demandas dentro do prazo", afirma. Ele é uma das personalidades mais envolvidas com o NAT-Jus no País.
Formado há 20 anos e atuando na gestão da saúde desde o início do exercício da profissão farmacêutica, assumiu a importante missão de responder as mais de 50 demandas recebidas por dia em até 72 horas. "Estou desde 2012 no Núcleo de Assessoria Técnica em Ações de Saúde do Rio que, por ter sido a primeira estratégia desse tipo de assessoramento técnico à magistratura, foi considerado pelo Conselho Nacional de Justiça, para que os demais Tribunais também tivessem estrutura similar”.
Análise de processos
A coleta detalhada de informações por parte dos profissionais ajuda a estabelecer uma linha de raciocínio dentro do parecer a respeito do item que está sendo pleiteado judicialmente. "Aí podemos inferir se há indicação direta, se há uso off-label de medicamento, porque isso é muito importante e, em muitos casos, há um amparo significativo e consolidado da prática clínica desse uso fora de indicação de bula, dependendo da especialidade como é na psiquiatria", explicou Badaró. Vencida a etapa da indicação, os peritos ainda avaliam se existe protocolo clínico e critérios de acesso no âmbito do SUS.
De acordo com Flávio, o trabalho realizado dentro do NAT-Jus tem como principal pilar a imparcialidade. "O parecerista farmacêutico não pode emitir uma opinião pessoal e a fonte das informações coletadas são inseridas como nota de rodapé nos pareceres. Isso ajuda a ampliar a visão do juiz que, de certa forma, nem sempre possui o conhecimento integral desse tipo de informação". A avaliação desses processos por parte dos profissionais da saúde é uma recomendação do Conselho Nacional de Justiça.
A equipe do NAT-Jus/RJ também é composta por enfermeiros, fisioterapeutas, nutricionistas e médicos, além de um corpo administrativo para manter um fluxo de elaboração, já que existem processos que não requerem somente um item. Além de medicamentos, são solicitados insumos, órteses, próteses, fórmulas nutricionais e procedimentos médicos. "Muitos processos analisados aqui recebem parecer técnico que é construído com a contribuição de mais de um profissional, não só do farmacêutico", afirma Badaró.
Para ingressar no Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário (NAT-Jus/RJ) como farmacêutico, a principal forma de acesso ocorre por meio de concurso público. Em relação à especialização, não há uma exigência específica. No entanto, é importante que o farmacêutico tenha conhecimento sólido em farmacologia, terapêutica e avaliação de evidências científicas para desempenhar efetivamente seu papel. "No NAT-Jus/RJ o farmacêutico ao chegar na equipe receberá treinamento composto por 3 módulos de capacitação e, somente após esse período, o colaborador inicia suas atividades com os processos de menor complexidade, em especial aqueles que contemplam apenas um medicamento", exemplifica o coordenador.
Como ocorre na prática a assessoria do NAT-Jus/RJ?
O coordenador explica que no Rio de Janeiro o Núcleo foi criado pela celebração de um convênio. Assim, não é uma estrutura do Poder Judiciário, assim como não é uma estrutura somente do Poder Executivo. "Ambos os poderes firmaram um termo de cooperação técnica, publicado em diário oficial.
No estado do Rio de Janeiro existem dois NAT-Jus. A estrutura criada em 2009 visa o assessoramento técnico aos magistrados do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro e, em 2011, foi firmado o início dessa atividade junto à Justiça Federal de Primeiro Grau no Rio de Janeiro.
Ambas as estruturas emitem, por meio dos pareceres, os subsídios técnico-normativos para análise de pedidos de liminar e tutela provisória nas ações que tenham por objeto o fornecimento, pelo Poder Público, de medicamentos, insumos para saúde, insumos nutricionais, tratamentos médicos, procedimentos médicos não emergenciais (consultas, exames, cirurgias e internação hospitalar).
"Todos somos funcionários da Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro, que desenvolvem suas atividades no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e na Justiça Federal no Rio de Janeiro", detalha.
A maior parte das demandas recebidas pelo núcleo são de processos cujo acolhimento inicial foi realizado pela Defensoria Pública do Estado e da União. Flávio Badaró explica que esses processos chegam ao Núcleo por meio de intimação eletrônica diretamente pelos portais eletrônicos do Poder Judiciário e o NAT-Jus/RJ peticiona diretamente aos autos os pareceres emitidos.
De acordo com Flávio Badaró, que também é membro do Grupo de Trabalho de Farmacêuticos no Sistema de Justiça do Conselho Federal de Farmácia, atualmente existem diversas estruturas com objetivo de reduzir, racionalizar ou qualificar essas demandas. Ao mesmo tempo, essas ações não deixam de garantir que o direito à saúde seja assegurado mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário aos serviços para sua promoção, proteção e recuperação, conforme está previsto na Constituição Federal.
A coordenadora do GT do CFF, Júnia Medeiros, acredita que a judicialização em saúde, principalmente em medicamentos, causa um grande impacto nas políticas públicas e reconhece a contribuição dos NAT-Jus, em especial a dos farmacêuticos, para a racionalizar os recursos. "O acesso à saúde por meio judicial cresce exponencialmente no Brasil e o papel do farmacêutico é essencial para qualificar este processo. O nosso GT busca contribuir com os colegas que atuam na Saúde Pública e que, diariamente, se deparam com ações contra municípios, Estado ou União". Ela diz ainda que o GT busca aproximação permanente com o judiciário para a inserção e reconhecimento da importância das ciências farmacêuticas nas decisões judiciais.