ENTREVISTA: PAPEL DO FARMACÊUTICO NA SAÚDE MENTAL


No dia 18 de maio é comemorado o Dia Nacional da Luta Antimanicomial. A data, que foi instituída no ano de 1987, está relacionada ao Movimento da Reforma Psiquiátrica, que se iniciou no final da década de 1970 no Brasil e lutava pelo fim do tratamento desumano e cruel dado aos usuários do sistema de saúde mental. Atualmente, no âmbito da saúde pública, o tratamento de pessoas que sofrem com transtornos mentais é feito principalmente através dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que conta com a presença de diversos profissionais da área de saúde, entre eles o profissional farmacêutico.

 

Para falar um pouco sobre o papel do farmacêutico na saúde mental, o Conselho Regional de Farmácia de Sergipe (CRF/SE) entrevistou o farmacêutico Dalmare Anderson, coordenador da Rede de Atenção Psicossocial/DAS/SMS Aracaju, Especialista Residente em Saúde Mental e Mestre em Ciências Farmacêuticas.

 

CRF/SE -  Com a Reforma Psiquiátrica brasileira foi adotado no país um modelo antimanicomial de saúde mental que tem os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) como instituição importante na saúde mental do país. Dito isso, qual é o papel do profissional farmacêutico no suporte aos pacientes com transtornos mentais dentro do CAPS?

 

Dalmare Anderson -  Os CAPS são os locais de cuidado principal e neles geralmente temos a dispensação de medicamentos controlados, isso por si só já justificaria a existência do profissional farmacêutico neste espaço. Contudo, a saúde mental nos proporciona uma vivência de campo e núcleo diversificada e diferenciada, de tal forma, ao mesmo tempo onde posso exercer as funções já clássicas ligadas a clínica farmacêutica eu posso realizar experimentação de atividades dentro do campo da saúde mental, realizando desta forma oficinas terapêuticas, ser técnico de referências, realizar atividades de matriciamento e tantas outras que são possíveis neste modelo de cuidado.

 

CRF/SE - Alguns CAPS são voltados aos tratamentos de pessoas adictas ao álcool e outras drogas. Nesses casos, existem ações diferenciadas que podem ser realizadas pelo profissional farmacêutico? Quais?

 

DA – As ações são muito parecidas nas diferentes clínicas. No cuidado a usuários de álcool e outras drogas, temos que ter uma maior supervisão de algumas questões clínicas principalmente ligados a hepatoxicidade, ou seja, se alguns medicamentos podem sobrecarregar o fígado de usuários que já podem ter este órgão comprometido.

 

CRF/SE -  Já no tratamento de transtornos mentais em crianças, quais são as diferenças da assistência prestada pelo profissional farmacêutico?

 

DA – É importante que observemos se o uso de medicamentos nesta fase da vida pode prejudicar o desenvolvimento normal destes usuários, além de sempre estarmos alertas para a possibilidade de patologização e medicalização desta faixa etária. Desta forma nosso olhar para a criança e os adolescentes é de preservar esses usuários do uso abusivo dos medicamentos.

Temos também que trabalhar as questões ligadas ao uso de medicamentos de forma lúdica para esta população que é possuidora de direitos e cidadania.

 

CRF/SE -  No que diz respeito ao Uso Racional de Medicamentos, quais as ações que o farmacêutico pode adotar no tratamento de problemas relacionados à saúde mental?

 

DA– Ser o principal provedor de informação sobre o uso de medicamentos para toda a equipe e sempre alertar sobre os abusos e usos indevidos que podem estar ocorrendo. Não vale para um paciente de saúde mental ficar aprisionado ao uso de medicamentos, sendo então liberto no território, mas preso farmacologicamente.

Qualquer uso que atrapalhe uma vida produtiva de fato deve ser criticado e seu uso reavaliado, o farmacêutico deve ser o profissional da equipe que cumpre o papel de estar sempre alerta.

 

CRF/SE -      Qual é a importância de o farmacêutico atuar de forma coletiva com outros profissionais da saúde mental, tais como psiquiatras e psicólogos? De que forma essa interação ocorre?

 

DA – Os CAPS trabalham de maneira interdisciplinar e transversal, o diálogo é constante e direto com toda a equipe, o compartilhamento de casos e da forma de cuidado é crucial e imperativa no cuidado. A troca de saberes por toda a equipe é constante, e a intervenção é cotidiana.

 

CRF/SE -  Como você avalia o atendimento farmacêutico prestado ao paciente com transtornos mentais aqui no estado de Sergipe?

 

DA– Em Sergipe graças a Residência Multiprofissional em Saúde Mental, que desde 2013, abre vagas para farmacêutico em seu grupo de residência, temos formado farmacêuticos que compreendem a forma de cuidar da saúde mental e que tem criado instrumentos e ferramentas para que se crie uma linha de cuidados farmacêuticos na saúde mental, temos um vasto campo de para a nossa profissão avançar nesta área da saúde.

 

CRF/SE Nesse Dia Nacional da Luta Antimanicomial, quais os avanços podem ser comemorados pela categoria farmacêutica?

 

DA – A possibilidade de toda esta população estar sendo cuidada de forma humana no território é o maior de todos os ganhos para a humanidade, não apenas para a categoria. Mas devemos comemorar a nossa inserção cada vez maior nos espaços de cuidados destes pacientes, não apenas no nosso modo de fazer básico, mas na inserção da gama de atividades que a saúde mental nos proporciona. O reconhecimento do farmacêutico como profissional que é habilitado através do CBO para realizar os procedimentos que ocorrem no CAPS foi uma das maiores conquistas nos últimos tempos ligados a esta área.